Opinião - China, Taiwan e Nancy Pelosi: entendendo a tensão

João Alfredo Lopes Nyegray*

Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos – algo equivalente à nossa Câmara dos Deputados –, esteve no início de agosto na ilha de Taiwan, que fica há 160 quilômetros da costa chinesa. Pelosi, uma crítica de longa data da China e do Partido Comunista Chinês, despertou a ira dos chineses que consideram Taiwan uma parte de seu país. Os taiwaneses, de outro lado, consideram-se uma nação independente e completamente distinta do regime de Pequim.

Para compreender melhor esse imbróglio, voltamos um pouco no tempo. A ilha de Taiwan esteve sob domínio chinês pela primeira vez no século XVII. Com os conflitos entre China e Japão no final do século XIX e início do XX, os japoneses dominaram a ilha. Quando o Japão perde a Segunda Guerra Mundial, em 1945, os chineses tomam o controle do local. Na mesma época, Mao Tsé-Tung lidera a chamada “Revolução Chinesa” e implanta um governo comunista totalitário na China em 1948.

Seus adversários republicanos, liderados pelo nacionalista Chiang Kai-shek fogem da China continental e abrigam-se em Taiwan. Inicia-se assim um “novo país”: uma república constitucional governada de forma democrática – o oposto do que ocorre no continente. Em 1954, quando a China estava muito longe de ser a potência econômica e militar que é hoje, os Estados Unidos e Taiwan assinam um tratado de defesa mútua. Isso significa que, caso Taiwan seja atacada por alguma nação, os EUA correriam em sua defesa.

A China de hoje, no entanto, é muito distinta daquela de 1954. Atualmente, os chineses são os maiores exportadores do mundo e possuem o segundo maior Produto Interno Bruto (PIB) do planeta. Sua política “uma só China” considera Taiwan não apenas uma parte do país mas também uma província rebelde. Apenas 13 países no mundo consideram Taiwan um país independente, e os demais mantêm neutralidade nessa questão delicada para não aborrecer o gigante chinês.

Ao visitar Taiwan, Nancy Pelosi manda um recado a Pequim: os EUA reconhecem a ilha como um país independente, ainda que não o declarem formalmente. Antes mesmo  que Pelosi desembarcasse na capital Taipei, os chineses iniciaram pesados exercícios militares na província de Fujian, o ponto mais próximo entre a China e Taiwan. Esses exercícios pesados foram seguidos de disparos de mísseis balísticos e violação do espaço aéreo taiwanês por aeronaves da força aérea chinesa.

E o que torna essa situação tão preocupante? Primeiro que, em virtude do tratado de defesa mútua, se a China atacasse Taiwan, os EUA poderiam defendê-la. Com isso, as duas maiores potências econômicas do planeta entrariam num confronto direto. Depois, Taiwan é a maior fabricante de chips e microchips do mundo. Sua indústria está muitos anos à frente do resto do planeta na produção desses itens, e toda indústria global de tecnologia depende da ilha. Qualquer ataque a Taiwan ou qualquer interrupção na produção taiwanesa pode fazer com que os preços de smartphones, computadores, geladeiras, micro-ondas e até mesmo automóveis disparem.

Como se isso já não fosse suficientemente preocupante, a visita de Pelosi a Taiwan pode aproximar ainda mais a China da Rússia – que atualmente está em guerra com a Ucrânia. Isso significa que os chineses podem passar a fornecer armas aos russos, o que pode tornar ainda mais sangrento e duradouro o conflito na Europa. Ou seja: por mais longe que possamos estar do centro das tensões, todo o planeta seria afetado por eventual conflito ali.

*João Alfredo Lopes Nyegray, especialista em Negócios Internacionais, doutorando em estratégia, coordenador do curso de Comércio Exterior e professor de Geopolítica e Negócios Internacionais na Universidade Positivo (UP). @janyegray

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